segunda-feira, 17 de março de 2008

Passeio

Fui dar uma volta. Fui comprar tabaco. Fui ver se estava a chover. Fui.
Não chovia e o tabaco sabia como os primeiros cigarros que fumei, intenso e o sabor pleno de tonalidades. O frio que na véspera me consumira tinha desvanecido. Sentado na esplanada de um café, pousei o casaco noutra cadeira e fiquei a pensar. Não pensei como era curioso nunca me ter sentado naquele café, naquela rua em que passo todos os dias. Não pensei nas guerras, nas fomes, nos presidentes e ministros que governam como crianças mijando sobre carreiros de formigas. Não.
Pensei com os sentidos. Pensei com a pele que me descrevia o toque morno do sol e o afagar da brisa ali, junto ao rio, que os ouvidos me narravam: o deslizar sereno das águas e as gaivotas que os olhos viam descer para pousar sobre o manto azul. Pensei com os lábios e a língua a carne irmã que os explorava, que os beijava. Sorvi o cheiro dessa mulher e adivinhei-lhe as formas.
Levantei-me por fim. Deixei lá o casaco, meio por vontade, meio por esquecimento. Se o for procurar agora, não o encontrarei. Não havia café, nem rio, nem tabaco. Fui, apenas.
E, com um sorriso, rodo agora a chave de casa enquanto seguro a sua cintura com a outra mão.

6 comentários:

Anónimo disse...

TÃO BOM TERES VOLTADO JAZZY... E COM ESTE MAGNÍFICO EXEMPLAR DE PROSA... SENTI A TUA FALTA :)

nonsense disse...

bons olhos te leiam!!!!

Jonas disse...

Aleluia!
São as chuvas que não chovem quando saímos para comprar tabaco que mais remorsos nos fazem...

(os intérpretes são uns assassinos do cacete!)

Anónimo disse...

vim conversar contigo mas continuas fechado em casa...

Kapikua disse...

pelos jeitos, desde que entraste em casa, não mais essa porta se abriu...

É valente!!! ;)

Abraço

Anónimo disse...

nok nok...
sai lá daí um cadinho, já voltas :(