terça-feira, 4 de dezembro de 2007

Sismo

Por vezes, quando o frio aperta, treme-me a mão. Começa suave; como um velho tique. De repente, porém, atinge-me como uma vaga: o vibrar segue para o braço, invade-me o corpo. Depois... Vêm as memórias. Não uma de cada vez; não, todas em simultâneo, desordenadas, perdendo toda a sua continuidade temporal.
Tentem perceber: é como se o momento em que nasci fosse o mesmo em que dei o primeiro passo; o instante do meu primeiro beijo parece-me o mesmo dia do funeral de um familiar (parece-me até que os enterrei a todos num mesmo segundo). E tudo sucede neste preciso instante.
Penso de onde virão estes tremores; quando começou esta estranha doença?
Impossível saber: todos os momentos em simultâneo. Talvez tenha cá estado desde sempre... Talvez tenha começado ontem, ou no dia em que... Que dia?
O pior, contudo, é quando param. Porque fica apenas o vazio. E as lembranças já não me parecem tão reais e então duvido delas. Sento-me num canto qualquer e procuro um raciocínio que me prove a veracidade daquilo que recordo.
...
Nada feito.
Vou -me sentar naquela rua fria onde me recordo de termos dito adeus. Ou julgo recordar... Pouco importa.
(Serás tu real também? O que sentimos? Acordar imerso no teu rosto? Ter o controlo do teu sorriso?... Terá tudo isso sucedido?)
Não vens. Mas chega o frio. Lentamente, a minha mão estremece.

1 comentário:

Anónimo disse...

tudo é ilusão! mesmo a ilusão! o bom de sabermos isto é a certeza de que o sismo também acaba... as leves impressões ou os profundos rasgos são filhos da mesma matéria.
cassamia